segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Brokenhearted Girl

Tudo poderia ser perfeito não fosse este meu coração partido, pequenos pedaços disformes espalhados por todo o lado. É como quando partimos um prato de porcelana, e mesmo depois de um grande esforço para limpar os destroços, há sempre pequenos restos de loiça estilhaçada em cantos recônditos.

Eu poderia ser feliz, não fosse a morte absurda de um amigo me ter roubado a alegria e me ter transformado para sempre num ser cinzento e sem esperança.

Eu poderia estar bem, não fossem as tuas palavras facas aguçadas, que me rasgam o peito e me ferem mortalmente. Tudo poderia ser diferente se tu me compreendesses, e me quisesses, e me amasses ou então se eu te odiasse ou nem sequer te tivesse conhecido. Tudo seria mais fácil.

A minha vida poderia ser perfeita não tivesse eu de fingir que tudo está bem, não tivesse eu de esconder as lágrimas que choro todas as noites, não fosse esta gaveta cheia de histórias que ninguém quer ler, não fosse este armário atulhado de memórias, de medos e de fracassos.

Tudo poderia ser perfeito, não fossem os teus olhos verdes em chamas, não fossem os teus beijos nascentes. Tudo seria perfeito não fosse este meu coração partido.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

No início deste Verão incerto


Hoje preciso falar-te. Contar-te a minha vida desde que te foste, as minhas pequenas histórias banais, os meus desencontros com o mundo. Estou junto da tua sepultura, sentada no início deste Verão incerto, as mãos trémulas e o coração nas trevas, o corpo e a alma devastados pela tua ausência. Quero dizer-te tantas coisas, tantas que se atropelam umas ás outras dentro da minha mente já quase louca, tantas que nem sei se vou conseguir expressá-las todas. Mas tenho a certeza disto: não aceito a tua vida interrompida, não aceito o vazio que persiste, não aceito o mundo sem tu existires nele, sorridente e límpido, como tu sempre foste nos dias felizes.
Desde que partiste, tudo ficou fora do sítio. A casa desarrumada, a roupa fora das gavetas, os livros caídos das estantes. Os corações fora do corpo, o amor sem encaixe. E eu sem ti.

O tempo parou nesse dia, e vivo agora numa dimensão diferente, num universo paralelo, numa espécie de sonho eterno, de onde nunca mais vou poder acordar.
Vivo empurrada pela rotina dos dias, pelas obrigações quotidianas, pelo tempo impiedoso que corre sempre, regular e inexorável, sem pausas.

Pergunto-me muitas vezes, como é possível que, mesmo depois da tua morte, o sol tenha continuado a nascer todos os dias, e as estações tenham mudado, e alguém tenha sido feliz. Não entendo. O certo seria que tudo tivesse ficado suspenso nesse momento, nesse terrível segundo em que te separaste da vida e de todos nós.
Não consigo viver sem ti. Estou, desde esse dia, á beira do abismo, fascinada pela vertigem da escuridão, ás cegas no centro do labirinto. Não encontro a saída. Estou, definitiva e irremediavelmente, perdida.

O tempo que passa não alivia a dor. Pelo contrário, torna-a cada vez maior, cada vez mais forte, generaliza-a ao corpo todo e torna-me cada vez mais vulnerável. O tempo é escasso, não chega para lamber as feridas, para me consolar o espírito. Tenho saudades tuas. Muitas. E isso dói-me.

Preciso dizer-te que estou, mais uma vez, desencontrada do que quero e do que preciso. Como quando nos conhecemos, lembras-te? Isso foi há muito tempo, tu eras uma criança traquina e tinhas o coração nos olhos e a alma exposta, e sorrias para mim com a confiança e o Amor de um irmão.
Gostava que estivesses aqui e que me abraçasses como nesses tempos felizes e atribulados, em que tantas vezes chorámos os dois para logo de seguida explodirmos em gargalhadas sonoras. Tu conhecias profundamente o meu coração e a minha essência, e hoje queria que estivesses aqui, junto a mim, para me dares a mão e para me segredares: “Eu entendo”.

Estou devastada e as lágrimas não são suficientes. Estou desfeita e o tempo passa muito depressa, depressa demais. A vida esmaga-me e tu não regressas.

Sentada junto á tua sepultura, no início deste Verão incerto, quero dizer-te que o meu Amor por ti é eterno, assim como tu, as tuas mãos de criança e o teu sorriso brilhante, iluminando a minha noite.

Tenho saudades tuas. Muitas. E isso dói-me.





Para o Cláudio, o meu Amor eterno (1983-2010)


sábado, 8 de maio de 2010

Dois anos

Dois anos. Passaram dois anos, mas podiam ser dois dias. Ou apenas dois minutos. O tempo, é por vezes, uma coisa estranha, um mistério indecifrável. É que há momentos na vida que simplesmente se colam ao nosso corpo, são permanentes, como tatuagens. É que há pessoas que, pelo simples facto de existirem, nos tornam outras pessoas, mais despertas, mais brilhantes, mais felizes. Depois de nos cruzarmos com elas, nada pode voltar a ser o que era. Dois anos parece muito tempo, mas para mim, é quase nada. Para mim, dois anos foi ontem á noite, e ainda estou, como nesse momento, movendo-me na confusão das pessoas, vibrando ao som da música, deslumbrada com o seu olhar luminoso e as suas mãos perfeitas.

Dois anos começaram antes disso. Começaram no minuto improvável em que o acaso me mostrou a sua imagem. Talvez o Amor tenha nascido logo aí, olhando uma fotografia sem nome nem história.
Dois anos começaram quando disse pela primeira vez o meu nome. Apenas uma palavra, dita num tom sussurrado, o olhar faíscando no escuro. Foi como se nunca tivesse ouvido o meu nome na boca de outra pessoa, como se eu tivesse nascido de novo naquele exacto momento. Uma sequência de apenas alguns segundos. inesquecível.
Depois, o tempo passa e envolve-nos no turbilhão da dúvida. Hoje estou no coração da tempestade, prestes a perder o pé e o fôlego.
Às vezes não sei quanto tempo passou ao certo. Dois anos? Dois dias? Dois minutos? É que há histórias que são tão improváveis que não acreditamos que são reais, há pessoas que de tão abençoadas, nos transformam noutras pessoas, nos acalmam o oceano em fúria e nos prendem num estado irreversível de febre terminal.
Dois anos. Hoje.